In the Rain

sexta-feira, 24 de março de 2006

Desgostos e confidências


Não teve dúvidas. Um dois, três, quatro, cinco goles. Não parou mais. Virou a
taça de vinho sem glamour e sem sentir cheiro ou gosto de nada.
- Outra! - Ordenou fria e secamente.
Bebeu sem limites e sem noções. Quando caiu no sono não havia amigos para
cuidarem dele, mas tinha deixado mais do que o suficiente para pagar os litros que engolira. Acordou ainda tonto, vomitou algumas vezes, cambaleou sem pressa, saiu na rua destemido.
Não caiu na sarjeta, não deitou-se em praça pública. De repente chorou
sozinho, num silêncio tão rancoroso e cheio de consciência. Logo após, riu, e
riu-se gostoso e sem compromisso, sem sequer antes enxugar as lágrimas tolas
que ainda lhe escorriam pelo rosto.
Entrou na casa vazia, largou-se no sofá sem dono, cerrou os olhos nos
joelhos, falou algumas coisas para si.
Que sofrimento mais tolo e bêbado, que sensação mais sem nexo e incômoda, que solidão mais amena e tola. Talvez quisesse por um instante ser seu próprio
confidente, mas as palavras suas para si mesmo eram tão sem sentido e
desconexas que perdeu a vontade de conhecer-se.
Levantou-se outra vez, tomou mais vinho, qualquer um que estivesse na adega
cheia deles. Caiu de lado, no chão, no centro da ampla sala vazia. Não
morreu, nem morreria, pelo menos não naquela noite. Esperou o dia nascer
enquanto vomitava desgostos e confidências. Não morreu, nem por isso começou
a viver.

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